Os últimos 70 dias de vida do pintor
Vincent van Gogh chega em Auvers-sur-Oise no dia 20 de maio de 1890. Em setenta dias, ele pinta quase todo o vilarejo: sua igreja, a praça da prefeitura, seu castelo, suas planícies, as paisagens às margens do Rio Oise, suas fazendas e ruelas. Este artigo conta a história da sua incrível estadia no vilarejo. Auvers-sur-Oise é o único lugar no mundo onde Vincent van Gogh parece ainda viver. A cada um de comprovar!
Vincent Van Gogh chega no vilarejo de Auvers-Sur-Oise na terça-feira 20 de Maio de 1890. Sua intenção é se hospedar alguns dias na cidade mas a sua estadia vai durar 70 dias. Alguns dias antes, ele deixara o vilarejo de Saint-Remy-de-Provence e o Asilo/hospício de Saint-Paul de Mausole, onde ele entrara voluntariamente e ficara durante um ano. Ali, após várias crises epilépticas e já se sentindo melhor, não suportou a presença de loucos no local e pediu a seu irmão Théo para preparar o seu retorno. Théo, vendedor de quadros em uma galeria em Montmartre, organisa o retorno do irmão.
Durante mais de 5 anos, Théo paga ao irmão uma pensão de 150 francos, equivalente ao salário mínimo atual, pois Vincent não consegue vender um só quadro. Théo tenta encontrar uma solução para o irmão, que tem uma saúde frágil e que talvez não suportaria a agitação parisiense. Ele pede a Pisarro que hospede seu irmão em sua casa em Eragny-sur-Epte. Pisarro, grande pintor e homem de grande coração, teria aceitado se não fosse a preocupação de sua esposa que temia que algo pudesse acontecer com algum dos seus 6 filhos, pois Vincent tinha a reputação de louco perigoso, após o trágico e cômico episódio das orelhas cortadas em Arles. Pisarro pensa em falar com seu amigo, o Doutor Gachet, médico em Paris e proprietário de uma casa de campo em Auvers-sur-Oise, onde ele passa três vezes por semana. O doutor é viúvo desde 1875 e tem dois filhos que são criados por uma governanta em Auvers: Marguerite, com 21 anos e Paulo com 17 anos.
Vincent se apresenta ao Dr Gachet em uma terça-feira 20 de maio com uma carta de apresentação de Théo, pois Vincent e o doutor não se conhecem ainda. O Dr Gachet é amador de pintura impressionista. Enquanto médico ele examina e aconselha Van Gogh que para evitar o retorno das crises, ele precisa pintar e pintar.
Por razões pessoais o doutor não pode hospedar Vincent mas ele lhe propõe um albergue não muito longe de sua casa por seis francos por dia. Vincent acha caro e escolhe ficar no Café em frente à Prefeitura, o Albergue Ravoux. Ali, por 3,50 francos ao dia ele se hospeda e ainda têm 3 refeições diárias.
Os dias são bonitos e longos em Auvers e Van Gogh os aproveita ao máximo, indo se deitar por volta das 9 horas e se levantando por volta das 6 da manhã. Desde a sua chegada ele percorre todo o vilarejo, o acha lindo e pinta muito. Próximo ao albergue ele pinta “As escadas de Auvers” (à esquerda), “Os Jardins de Daubigny” (à direita) e outros. Daubigy foi o precursor dos impressionistas, alguém que Vincent admira desde muitos anos.
Ele pinta a igrejinha de Auvers, da maneira como ele a vê, colorida, vibrante e com uma luz interior intensa. Além de pintar ele sente a necessidade também de escrever. Ele descreve os seus quadros como se ele necessitasse de palavras, além de cores para alcançar uma completa realização. Além do vilarejo, ele descobre também o planalto e os vastos horizontes, os campos de trigo e de outros cultivos. Ele almoça todos os domingos na casa do Dr Gachet e às vezes também na segunda e na terça feira para terminar uma tela. Entre os dias 2 et 7 de junho Van Gogh pinta o autorretrato do doutor. Em seguida, ele faz uma cópia para o mesmo que fica fascinado com o resultado. Ele pinta o jardim e o autorretrato de Marguerite, a filha do doutor no piano.
Vincent está calmo, sem angústias e se admira consigo mesmo. Ele pinta com a mesma intensidade que quando estava no vilarejo de Arles. No Albergue, ele é um cliente acomodado “ele nunca levou um prato”, diz a filha do proprietário, com 13 anos na época.
Quase todos os dias escreve uma carta ao seu irmão Théo contando de sua vida cotidiana, de sua amizade com o doutor e de seu projeto de ver Théo com sua família de férias em Auvers. No dia 8 de junho é um dia de festa pois Théo vem com a sua familia para passar um dia.
No início de julho, Théo o convida para passar alguns dias em Paris, ele vai mas não consegue ficar nem mesmo um dia completo. Em suas conversações, Théo comenta sobre seus problemas financeiros e de saúde. Vincent se sente um parasita e pensa o que seria da família de seu irmão se este viera a faltar e o que seria dele, que pinta quadros os quais o grande público não se interessa?
Ele se refugia no trabalho. Pinta e expressa a tristeza e a solidão em seus quadros. Nessa época, pinta “Campo de Trigo e os corvos” e a Prefeitura de Auvers-sur-Oise.
Durante o mês de julho, Vincent insiste a seu irmão para que venha passar as férias com ele em Auvers, Théo decide ir à Holanda levar o novo bebê para apresentar à família. Ele parte no dia 15 de julho sem cogitar de levar Vincent. O Dr Gachet está em Paris durante toda a semana. Vincent está sozinho, com o sentimento de abandono e rejeição. Os dias passam e os sentimentos de amargura e decepção se intensificam. Se sente inútil por depender financeiramente de seu irmão.
No dia 27 de julho após o almoço ele deixa o albergue. No entardecer todos o esperam para jantar. A noite cai e ele retorna de cabeça baixa e se refugia no quarto. O proprietário do albergue sobe e o encontra na cama, ferido com uma velha pistola que ele a encontrou em uma gaveta no piso térreo. Todos saem à procura do médico do vilarejo. O Dr Gachet recomenda o repouso pois o transporte até o hospital mais próximo e uma intervenção no local seria impossível. Vincent deixa uma carta ao irmão que será levada no primeiro trem da manhã. Théo chega na tarde do dia 28 e ambos falam em holandês. Vincent não parece sofrer mas fica cada vez mais fraco e sonolento. No dia 29 de julho à 1h30 da manhã ele deixa de respirar.
O velório foi organizado no albergue, rodeado pelos seus quadros e por girassóis trazidos pelo Dr Gachet. O enterro foi no dia 30 de julho sem passar pela igreja pois ele era protestante e havia cometido suicídio. O doutor Gachet, emocionado, pronunciou algumas palavras. Théo encontrou forças para esvaziar o seu quarto, distribuiu alguns de seus quadros e levou o resto para Paris.
O pintor repousa no pequeno cemitério do vilarejo, perto dos campos que serviram de cenário para os seus últimos quadros. Théo, falecido seis meses após a morte de Vincent, e enterrado à Utrecht, foi transferido em 1914 à Auvers, à pedido da viúva. Através dos cuidados do filho do Dr Gachet, um manto de ervas foi plantado e cobre os dois túmulos gêmeos dos dois irmãos Van Gogh.
Túmulo de Vincent e Théo Van Gogh em Auvers-sur-Oise
Texto: Andréa Rodrigues dos Santos
Fonte: MILLON, Claude. Vincent Van Gogh à Auvers. Condé-sur-Noireau : Valhermeil, 2010.
Para maiores detalhes sobre essa visita siga o link
François Faugeras
C’est vraiment un endroit à visiter ce petit village au bord de l’Oise pleine d’histoire à raconter.