Nós as árvores

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A exposição “Nous les arbres”, “Nós as árvores”, organizada pela Fundação Cartier, tem como objetivo de levar ao público a voz de uma comunidade de artistas, botânicos, filósofos que desenvolveram por meio de um percurso estético ou científico único, uma ligação íntima e forte com as árvores, levando à tona toda a beleza e complexidade biológica desses seres vivos fortemente ameaçados.

As árvores, assim como o conjunto do reino vegetal, foram alvo de estudos científicos nos últimos anos. Segundo os especialistas, existe uma “inteligência vegetal”, o que quer dizer que elas têm capacidades sensoriais, são aptas à comunicação, desenvolvem a memória, têm relações de simbiose com outras espécies e influenciam o clima.

Indo ao encontro dessa “revolução vegetal”, a exposição cruza as reflexões de artistas e de pesquisadores que exploram as questões ecológicas, e questiona o lugar do homem no seio desse mundo vivo.

A exposição é organizada com base na comparação das obras de artistas da América Latina, Europa, Estados Unidos, Iran assim como obras de artistas oriundos de comunidades indígenas como os Nivaclés e os Guaranis no Paraguai, e dos Yanomamis na Amazônia Brasileira. O percurso desenvolve três temas específicos: o conhecimento das árvores (botânica), a estética (contemplação) e a devastação (constatação documentada).

A experiência de uma cumplicidade cotidiana com as árvores constitui a inspiração primeira de artistas brasileiros e paraguaios reunidos nesta sala decorada com uma floresta de árvores observadas, admiradas ou sonhadas.

Reunindo pinturas, monotipos e uma mesa-herbário, o artista brasileiro Luiz Zerbini orquestra na sua obra o reencontro imaginário entre a Floresta Amazônica e os símbolos da modernidade urbana Brasileira. Atentivo às cores vivas das plantas e a maneira como elas se desenvolvem o artista compõe as suas telas. A ideia é dar a sensação de estar no meio de uma floresta. Paralelamente ele produz os seus monotipos (gravuras).

No centro da sala, uma mesa herbário pensada pelo artista como uma pintura em três dimensões mistura diferentes espécies vegetais, cuidadosamente escolhidos pelas suas qualidades estéticas.

Luiz Zerbini – Mesa herbário – amostra de plantas colhidas durante suas caminhadas

Foto: https://www.fondationcartier.com/expositions/nous-les-arbres

Em meio a esta floresta urbana entre sonho e realidade estão os desenhos de três artistas Yanomamis da Amazônia Brasileira: Kalepi, Joseca e Ehuana Yaira, habitantes autóctones da floresta. Aqui eles representam as árvores que os rodeiam e as quais eles utilizam os frutos, as folhas, e tudo mais. Para se nutrir, se curar ou para reverenciar com ritos Xamânicos. Eles evocam uma floresta-mundo, habitada por seres visíveis (homens, animais e vegetais) ou invisíveis (espíritos).

Kalepi, Primeira foto – Samasiti, 2019 e as duas seguintes Hai Hi, 2018

Foto: @visitasguiadasemparis

 

Joseca, sem titulo (Espírito Xamânico vegetal feminino), 2018

Foto: @visitasguiadasemparis

 

A intimidade desta cosmologia animista (objetos que possuem alma ou espírito) se encontra nas obras dos artistas Nivaclé e Guarani do Paraguai, entre eles: Jorge Carema, Esteban Klassen e outros. Estes artistas vivem no Grande Chaco que passa por problemas de desflorestamento incríveis. Nos seus desenhos eles se recordam na floresta como ela era no passado, habitat natural de várias espécies animais. Elas também eram fonte de vida para os habitantes locais pela caça e coleta de alimentos. Essas obras testemunham a ligação que eles têm à floresta e as interações entre seres humanos e espirituais que ainda existem nelas.

Efacio Alvarez, Paraguai     Foto @visitasguiadasemparis

Esteban Klassen, Paraguai    Foto @visitasguiadasemparis

Clemente Juliuz, Paraguai    Foto @visitasguiadasemparis

 

Reunidos na pequena sala do térreo, estão obras que tratam da relação entre o homem e a árvore.

Começamos com o artista-semeador Fabrice Hyber, que plantou 300 mil sementes de árvores no Vale da Vendée. Ele mostra na sua arte uma observação poética e pessoal do mundo vegetal. Ele se une ao grupo que realiza pesquisas científicas sobre a inteligência das plantas ou a comunicação das árvores. Segundo ele, quando ele desenha uma árvore ele prefere se colocar no seu lugar. “Eu imagino que elas têm comportamentos humanos e funções invisíveis: como nós, elas se deslocam e se comunicam com os outros, elas podem ser loucas ou dóceis, histéricas ou calmas, em função do contexto e do meio ambiente”.

Fabrice Hyber, Impossible – 100 pommes 1 000 cerises, 2006

Foto @visitasguiadasemparis

 

No outro extremo da sala, um documentário dá a voz àqueles que estão sempre ao lado delas, que as observam, as cobrem de cuidados, as admiram e que lutam por elas.

O Brasileiro Afonso Tostes criou uma série de ferramentas antigamente usados com cabos esculpidos em madeira que evocam, muitas vezes, os ossos do corpo humano e os galhos das árvores (foto abaixo à esquerda). Encontramos também a madeira representada de uma maneira mais espiritual através dos ex-voto ou pagamentos de promessas esculpidos (foto abaixo à direita). Testemunhos de uma tradição religiosa da arte popular brasileira, estas esculturas de partes do corpo curadas são, em seguida, colocadas em uma igreja como agradecimento ao milagre recebido.

 

No piso inferior onde se distribui a segunda parte da exposição, em torno de 180 obras de mais ou menos vinte artistas e botanistas exploram a beleza plástica e a complexidade arquitetural das árvores. As obras do brasileiro Alex Cerveny inauguram o percurso e retoma o tema da interdependência entre humanos e árvores. Suas pinturas, misturando referências autobiográficas, bíblicas, etnográficas e geográficas, queimam as fronteiras entre os seres e os mundos.

Alex Cerveny, Rio Negro e Solimões (esquerda) e Paraná Paraguai (direita), 2019.

Foto @visitasguiadasemparis

 

Em contraste com essa aproximação onírica os arquitetos e designers italianos Cesare Leonardi e Franca Stagi consagraram dez anos de suas vidas à observar e desenhar de maneira aprofundada e metódica, diferentes espécies em diferentes estações do ano. Estudando a variação de sombras e cores durante as diferentes estações eles desenvolveram um conhecimento íntimo das árvores e uma empatia em relação a elas. O italiano Stefano Mancusi é um dos pioneiros dos estudos sobre a nova biologia vegetal, desenvolvendo pesquisas ligadas à sensibilidade das árvores assim como sua capacidade de memória, de simbiose e de comunicação.

O iraniano Salim Karami (abaixo) desenha com caneta esferográfica. Ele busca inspiração nos motivos dos tradicionais tapetes Persas, onde a árvore da vida mostra uma ligação entre os mundos celestes, terrestres e subterrâneos.

As silhuetas graciosas das grandes árvores da artista colombiana Johanna Calle (abaixo), formam uma enigmática floresta de papel e se tornam vetores de uma mensagem política. A elegância contrasta com a gravidade dos temas que evoca seus galhos e folhas datilografadas: o desflorestamento, a fragilidade dos ecossistemas, as espécies endêmicas, a espoliação das terras dos camponeses nativos colombianos.

Foto: https://www.fondationcartier.com/expositions/nous-les-arbres

 

Abaixo, o pintor brasileiro Nilson Pimenta (abaixo), representa de maneira trágica, a destruição da floresta do Mato Grosso, como uma cena noturna de um vasto massacre colonial.

 

Além dessas obras citadas aqui, inúmeras outras participam desta exposição. “Nous les arbres” prolonga a exploração de questões ecológicas e nos faz refletir sobre o lugar do homem nesse mundo vivo que são as árvores.

Exposição de 12 de julho 2019 a 10 Novembro de 2019.

 

Quer conhecer essa exposição? Entre em contato conosco que organizamos tudo para você.

Texto: Andréa R. S. Faugeras

Fotos: François Faugeras e @visitasguiadasemparis

Fonte:

Visita pessoal da Exposição “Nous les arbres”.

Material publicitário de visita à exposição.

Site web: https://www.fondationcartier.com/

 

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